A Cultura vista sob um ponto de vista terapêutico
Nos
dias atuais, em pleno século XXI, sabe-se que a vida nos grandes centros
urbanos está cada vez mais acelerada. As pessoas vivem aprisionadas nas regras
que elas mesmas criam, se preocupam se darão conta de todo serviço proposto (ou
imposto), se terão dinheiro para pagar suas contas no final do mês, etc. A
globalização e a tecnologia acabaram por gerar um maior acesso a informações e
rapidez na comunicação com o mundo, mas em contrapartida contribuíram para o
aumento de diversas psicopatologias, entre elas a depressão e a síndrome do
pânico. Um dos fatores que contribui
para isto é o isolamento gerado pela tecnologia. Essa “nova linguagem” que é a
informatização, tem gerado um certo “isolamento social” nas pessoas, o que pode
contribuir para o surgimento do sentimento de solidão e desamparo. Em alguns
casos, sintomas depressivos podem aparecer, e em outros, essa esquiva ao
convívio social pode gerar sintomas de síndrome do pânico, sendo que desde o início
do século XX esses dois transtornos psíquicos são vistos como as “doenças do
século”.
Em
psicanálise, existe o que se chama de “Mecanismos de Defesa do Ego”, que
possuem a função de auxiliar o indivíduo a viver com menos sofrimento.Os
“mecanismos de defesa” mascaram a causa real do problema, mas são utilizados
pelo ego como proteção contra as angústias. Existem vários mecanismos de
defesa, a citar como exemplo a “negação”: quando se perde um ente querido, a
primeira reação que se tem é negar sua morte, para suportar a dor da perda.
Muitas vezes não se consegue nem ir ao enterro deste ente, pois se está
literalmente “negando” sua morte. Aí o indivíduo está utilizando o “mecanismo
de defesa” chamado “negação”.
Um
outro “mecanismo de defesa” utilizado pelo inconsciente chama-se “sublimação”.
Sublimar é a capacidade de transformar sentimentos negativos em sentimentos
positivos, através de uma atividade agradável e construtiva, que frequentemente
é ligada a atividades culturais, artísticas ou intelectuais. Partindo deste
ponto de vista, a arte e a cultura são altamente “sublimatórias” e, por conta
disso, possuem grande poder terapêutico. Exemplificando: se o indivíduo está se
sentindo angustiado por algum motivo, ele pode escolher entre reclamar,
alimentando sua angústia, ou ir ao teatro, assistir a um bom show musical, ou
fazer uma aula de dança de salão.
Portanto,
as pessoas que buscam a arte e a cultura, seja para apreciar ou para executar a
atividade artística, acabam adquirindo maior qualidade de vida, pois isso pode
influenciar tanto na saúde física quanto na saúde mental do indivíduo.
O
entretenimento e o esporte também têm “capacidade sublimatória”, porém, não
contribuem para o aumento da intelectualidade do indivíduo, nem para sua
sensibilização. Já a arte e a cultura contribuem. Além do mais, a cultura é uma
forma de resgatar os costumes e valores de um povo, resgatar sua identidade
cultural, e isto é de extrema importância para o indivíduo e para a sociedade.
Por isso o poder público deve apoiar e estimular o “fazer artístico e
cultural”, bem como estimular a sociedade civil a consumir cultura, para
melhorar sua qualidade de vida.
Vale
lembrar que a arte e a cultura possuem o poder de sensibilizar, humanizar, trazer
sentimentos fortes, intelectualizar, além da função terapêutica que exercem
(capacidade de transmutar sentimentos negativos/reduzir angústias), como já foi
explicado acima. Ou seja, possuem a capacidade de transformar o ser humano para
melhor, por isso devem ser muito valorizadas e apoiadas. É este olhar que deve
ser lançado sobre a cultura. Já o mero entretenimento empobrece a alma.
Muitas
vezes uma atividade artística pode “salvar” o indivíduo de uma depressão. Pode
trazê-lo de volta à vida, sociabilizando-o, resgatando sua auto-estima e seu
desejo em continuar vivo. Neste sentido, deve ser vista como um fator de suma
importância para a sociedade.
Numa
sociedade onde a individualidade, o egocentrismo e a solidão imperam, a arte e
a cultura são primordiais para trazer de volta sentimentos nobres que
engrandecem a alma de quem as executa (artistas) e de quem as recebe (público). Cabe a grande mídia dar mais apoio a elas,
para que a sociedade perceba seu devido valor.
Uma
última observação importante a se fazer neste texto é que os “mecanismos de
defesa” não resolvem o problema em si, mas auxiliam muito no alívio das
angústias. Claro que para se enfrentar as causas reais do sofrimento,
principalmente quando este for intenso, deve-se buscar tratamento psicológico.
Assim, através do auto-conhecimento a pessoa acaba por conhecer os motivos
reais de seus conflitos (que muitas vezes estão escondidos no inconsciente), e
aí sim, buscar as transformações necessárias para viver melhor e mais feliz.
De
qualquer modo, este texto veio alertar que atividades artísticas geralmente
terão função terapêutica na vida das pessoas, trazendo leveza e alegria,
sentimentos estes muito bem-vindos para a melhoria da qualidade de vida e
redução das angústias.
(28/08/2013)
Sobre a autora:
Lia
Cordoni é psicóloga, especialista em psicanálise pela PUC-SP e especialista em Medicina Chinesa-Acupuntura no Instituto de Psicologia e Acupuntura Espaço Consciência, em São Paulo.
Trabalha como acupunturista e faz shows musicais esporadicamente.